Por Redação do Jornal de Itirapina (JI)
Nos Bastidores da Denúncia
A investigação por improbidade administrativa envolvendo a gestão do ex-prefeito Adnan Ortolan, à frente do Município de Cordeirópolis entre os anos de 2017 e 2024, foi conduzida pelo Ministério Público de Cordeirópolis.

Foto |Reprodução
Em 2020, o promotor de Justiça de Cordeirópolis, Alberto Segalla Bevilacqua, acolheu denúncia formal apresentada contra o Município. A representação apontava que um integrante da Guarda Civil Municipal estaria acumulando cargos de maneira irregular, recebendo horas extras indevidas e, paralelamente, prestando serviços de segurança privada para uma Empresa.
As folhas de registro de ponto do servidor investigado, segundo consta nos autos, foram assinadas por seus superiores hierárquicos e homologadas pelo Departamento de Recursos Humanos da Prefeitura. Parte desses documentos apresenta rasuras, e deles se apurou que o servidor teria recebido, ao longo dos anos, centenas de milhares de reais em pagamentos considerados indevidos.
A apuração realizada pelo Jornal identificou que, em média, o servidor recebeu indevidamente valores superiores a R$ 60.000,00 por ano, no período compreendido entre 2017 e 2021. A reportagem teve acesso a uma planilha que detalha os pagamentos efetuados mesmo após a formalização da denúncia, no ano de 2020, quando as irregularidades já eram de conhecimento geral. Ressalta-se que o servidor permaneceu no cargo até julho de 2021, aproximadamente um ano após a denúncia ter sido protocolada.

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A planilha em questão apresenta registros de salários-condição e horas extras, valores que, de acordo com especialistas consultados pelo Jornal na área Jurídico-trabalhista, são considerados incompatíveis com as funções de um cargo gratificado, uma vez que tais cargos possuem atribuições estritamente administrativas. Conforme apontam os especialistas, a nomeação para função gratificada exclui, por sua natureza, o recebimento de salários-condição.
Diante disso, a equipe de reportagem buscou aprofundar a apuração e realizou uma comparação entre as atribuições do cargo ocupado pelo servidor denunciado e as funções desempenhadas em outros cargos administrativos do Município, que, por sua natureza, são exercidas exclusivamente em horário comercial e sem controle formal de jornada. O resultado dessa análise encontra-se apresentado a seguir.

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De acordo com apuração do Jornal de Itirapina, o servidor foi nomeado em 2017, por meio da Portaria nº 10.592, para ocupar um cargo gratificado na gestão do então prefeito Adnan Ortolan, permanecendo na função até julho de 2021. Ainda segundo as informações obtidas, a denúncia sobre o caso foi formalizada em 2020, entretanto, mesmo após a ciência dos fatos, o servidor continuou no cargo por mais um ano. Durante esse período, os registros apontam que ele recebeu, de forma indevida, valores que ultrapassam a marca de R$ 250 mil.
Em 2023, o processo foi arquivado a pedido da promotora Aline de Moraes, sob o fundamento do falecimento do servidor, encerrando a apuração judicial das irregularidades atribuídas à administração pública. O arquivamento ocorreu sem que houvesse, até o momento, qualquer informação de encaminhamento do caso para apuração na esfera administrativa, conforme recomenda o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).

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Após a formalização da denúncia e o início das investigações conduzidas pelo Ministério Público, as irregularidades envolvendo o servidor já eram de conhecimento geral. Mesmo assim, ele foi mantido simultaneamente em duas funções: atuava como Guarda Civil Municipal no período noturno e como Coordenador da Defesa Civil durante o dia. Paralelamente, exercia ainda atividade extra remunerada como vigia em Empresa Privada.
A apuração realizada pelo Jornal revelou que os controles de jornada, aos quais a reportagem teve acesso, registram o pagamento de mais de 90 horas extras em apenas um único mês. Os dados, considerados públicos, confirmam a prática e reforçam as inconsistências no caso.
Conforme apurado nos autos, a advogada do Município, Graziela Boggian Levy — que atualmente ocupa o cargo de chefe da Procuradoria Jurídica — solicitou prazo ao Ministério Público sob a justificativa de que o Município estaria elaborando uma nova legislação para apurar os fatos. Entretanto, não há registro de qualquer manifestação por parte da procuradora recomendando a suspensão dos pagamentos considerados irregulares, tampouco a adoção de medidas para ressarcimento dos valores aos cofres públicos.
Na ocasião, o então chefe da Procuradoria Jurídica, advogado Marcos Magalhães, afirmou em sua defesa desconhecer as irregularidades e alegou que as folhas de ponto do servidor investigado não tramitavam pelo setor jurídico da Prefeitura.
A apuração das folhas de ponto e a autorização dos respectivos pagamentos são de responsabilidade do Departamento de Recursos Humanos do município, setor que, desde 2008, é supervisionado pelo servidor de carreira Celso Desidério Gomes. Independentemente das mudanças no comando da Secretaria de Administração, Celso permaneceu como responsável direto pela área, inclusive durante o período em que foram efetuados os pagamentos irregulares ao servidor denunciado.
Sem a anuência do supervisor, os repasses indevidos não teriam sido processados, uma vez que, do ponto de vista administrativo, seria inviável que o próprio beneficiário controlasse e autorizasse seus próprios pagamentos.
A constatação de que o servidor não teria condições de executar, sozinho, todas as irregularidades apuradas ao longo da investigação não foi suficiente para sensibilizar o Ministério Público, que solicitou o arquivamento do processo com base no falecimento de um dos envolvidos no caso.
A conclusão do inquérito e o pedido de arquivamento coincidem, ainda, com a derrota do ex-prefeito Adnan Ortolan nas urnas e com o pedido de transferência da promotora pública de Cordeirópolis, Aline de Moraes, para a comarca de Iracemápolis.
Durante o curso da apuração, os advogados do Município adotaram sucessivas medidas que resultaram no prolongamento dos prazos e na postergação das etapas processuais, estendendo a investigação por mais de três anos, sem que houvesse responsabilização concreta ao final.
E agora, quem paga o prejuízo?
Quem arcará com os valores pagos indevidamente aos cofres públicos?
Até o fechamento desta edição:
— O Município de Cordeirópolis não respondeu aos questionamentos;
— O ex-prefeito Adnan Ortolan não conseguimos contato;
— Os advogados do município não se manifestaram;
— O Supervisor do RH não apresentou resposta;
— A Promotoria encaminhou resposta.
Enquanto isso, o prejuízo aos cofres Públicos de Cordeirópolis segue sem reparação.